sábado, 13 de novembro de 2010

Les Choses

Eu gosto de coisas. Não por acaso, admiro o temido – para muitos, execrável – Alain Robbe-Grillet, em sua primeira fase, a conhecida como “chosiste” (coisista). As coisas nos dizem: roupas, acessórios, livros, quadros, móveis, revistas em quadrinho, CD´s e DVD´s. E, às vezes, deixam de dizer. Algumas semanas atrás, uma colega de trabalho criticou os meus brincos. Na hora, fiquei irritada. “Será possível que, ao acordar, às 5h da manhã – o que, por si só, já é sofrimento suficiente –, eu ainda terei que pensar com calma na escolha do que penduro na orelha?” Dias depois, remexi o porta-joias: meus brincos realmente não tinham mais nada a ver com a “eu de hoje”. Já tiveram, claro, na minha fase hippinha. Mas isso ficou para trás e os brincos também deveriam ter ficado. Não tenho, porém, coragem de jogar as coisas fora, assim, a sangue-frio. Então peguei uma caixa bonita, e guardei ali os brincos que não mais me traduziam. Dei à senhora que lava a minha roupa, sempre tão cordial e caprichosa. Ela tem filhas e sobrinhas, e alguém poderia, quem sabe, gostar de alguma das bijuterias. E vi que tinha acertado quando, ao entregar a sacola de roupas limpas, a senhora veio acompanhada da filha, de uns oito anos... assim que abri o portão, a menina me esperava, com os braços na cintura, o peito estufado, como uma super-heróina, exibindo-me um par de brincos vermelhos, compridos, outrora meus, e um sorriso indescritível. Fiquei feliz por uma semana por causa daquilo. (...) Outra coisa que me faz pensar nas coisas: o supermercado. O Veríssimo (o Luís Fernando) já escreveu sobre como o lixo descreve nossas personalidades. Mas antes do lixo vem a lista de compras. É um dos meus passatempos favoritos: tentar adivinhar as rotinas por aquilo que as pessoas colocam no carrinho de compras. Dias atrás, entretanto, notei que estava sendo vítima do meu próprio veneno: o caixa que costumeiramente me atende, um moço bonzinho lá de Barbacena, começou a querer puxar conversa através dos itens na esteira. Primeiro foi o bolo que comprei no meu aniversário, as velinhas, a idade, se ia ter festa; depois, os sacos de pirulitos que distribuí para os meus alunos no centenário do Corinthians... e mais conversa, indo e vindo, assim, sucessivamente. Até que, para arrematar a curiosidade e calar as pretensões possivelmente amorosas do rapaz, comprei um vinho chileno e um par novo de taças. Seu olhar triste para a garrafa foi de dar dó. É, as coisas, por si mesmas, podem ser só coisas, mas como dão margem à imaginação...

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Só para constar: duas semanas atrás, em Três Corações, minha madrinha contou que o Juninho (veja postagem anterior) sempre assiste aos jogos do Corinthians, e a chama: “Vem, Vó, vem ver, é o Corinthians. A Gelly deve estar lá torcendo, né?” Achei comovente. Resultado: dei a ele, no dia seguinte, a prometida camisa do Timão.

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Todo mundo vai falar que não foi pênalti, que foi roubado, que o Corinthians – sabe-se lá por que – é o queridinho da mídia, da arbitragem, do governo, do Bope, da Interpol... Mas a gente ganhou. Estão lá os três pontos, vamos dormir na liderança, estamos felizes (assim como o Galo que, merecidamente, goleou o Luxemburgo). E, pelo menos por enquanto, como diz o filósofo James Hetfield, “nothing else matters”.