sábado, 1 de junho de 2013

Portugal: minha grande madeleine

Sempre que falam em comida de mãe, eu penso nas quitandas que faz minha Madrinha, uma pessoa incrível, que entra para o Top 5 dos meus grandes amores. Minha mãe me fez querer ser forte; meu pai, a buscar a inteligência; mas, se há alguma doçura em mim, foi minha Madrinha quem me emprestou. Passou a vida criando filhos, netos, sobrinhos, com paciência e mãos de fada para a cozinha. Cada um de nós tem a sua quitanda preferida: brevidade, bolo de fubá, broa, biscoito de nata... Quando eu era pequena, e ela cuidava de mim enquanto meus pais estavam no trabalho, eu contava os minutos para o café da tarde – literalmente. Uma vez, disse a ela: “já está na hora, Madrinha!” E ela explicou que tomávamos café às 15h, que eram ainda 14h. Sentei-me na cama dela, de frente para o rádio-relógio, e fiquei uma hora inteira vendo os minutos se passarem, os números se transformarem, como diante de uma ampulheta vermelho-brilhante. Essa é até hoje, de todas, a minha maior gula. Posso ficar sem sobremesa pelo resto da vida, mas não me deixe sem café com bolo! E quando, dias atrás, tive a oportunidade de visitar a terra dos nossos colonizadores, senti uma imensa alegria ao descobrir de onde vinham as receitas deliciosas da minha Madrinha. Os doces típicos portugueses, como o “travesseiro”, que se come em Cintra, têm a massa, a cobertura de canela e açúcar, tradicionais no interior de Minas. Foi como a madeleine do Proust, só que em muitas formas e sabores: no peixe que meu tio Jair pescava e levava de presente para minha mãe, no arroz-doce que minha avó fazia e que meu pai adorava, nos pasteis-de-Belém e afins, tão parecidos com as receitas da minha Madrinha. Pensei neles o tempo todo. Porque as belezas ficam mais bonitas quando nos evocam as pessoas que amamos. E quantas belezas há em Portugal! Em Cascais, em Porto, no rio Tejo, em Alcochete, em Lisboa, no Cabo da Roca – lugar em que me esqueci de todos os meus arrependimentos e onde entendi por que os portugueses, naquele sotaque melífluo, dizem que o mar é deles. Foi uma viagem de reencontros: com importantes amigos e fundamentais lembranças. Fez bem – faz bem a saudade. Voltei para casa com um quilo a mais de leveza. (01 de junho de 2013.)