Diego e eu esperávamos o meu irmão na rodoviária. Fazia calor e compramos uma garrafa de suco – de frutas cítricas, se não me engano. Foi então que reparei no Pedro, um menino de mais ou menos dois anos, que, por causa do suco, já havia reparado em nós. Sentindo o peso insistente do olhar dele, pedi ao Diego que lhe desse o restante do líquido. A mãe estava do lado, com um bebê no colo e uma expressão de total desamparo. Não se importou com nossa aproximação. O menino bebeu, satisfeito, e depois pôs-se a brincar com a garrafinha de plástico e, em seguida, com a tampa laranja do recipiente. O jogo era aquele de sempre: a tampinha caía, um de nós se abaixava, pegava-a, entregava-lhe. Aos poucos a queda passou a ser voluntária e cada vez em lugares mais complicados e distantes. Ele se divertia, fazendo-nos de escravos, dispostos a aceitar os desafios que nos impunha. Quando meu irmão chegou, ainda brincávamos com o Pedro – ou ele brincava com a gente – e eu acabava de ter a ideia de lhe dar um pirulito. Como, entretanto, a embalagem estivesse ainda grudada no palito, o menino não experimentou do doce, mas manteve a atenção voltada para aquele papelzinho que não se soltava. Resultado: o pirulito caiu no chão. E, que se ressalte: no chão da rodoviária, que é dos sujos o mais imundo. Peguei o pirulito, expliquei-lhe que não se podia comer as coisas do chão – como se ele me entendesse – e atirei o doce na lixeira mais próxima, pensando em comprar-lhe outro em seguida. Qual não foi, contudo, o horror nos olhos daquele menino diante de meu gesto atroz. Ele os arregalou e abriu a boca num grito de imensurável perplexidade, como se dissesse: “O que essa maluca está fazendo, Meu Deus???” Eu corri até o bar, comprei outro pirulito, desembrulhei e entreguei a ele novamente. Não saí de perto enquanto não o vi colocando o doce naquela boca bonita, de criança feliz. E fiquei pensando na matéria que compõe as decepções. Porque, no momento em que Pedro me viu atirando o seu pirulito no lixo, ele não pensou no tempo que havíamos passado ali, gratuitamente tentando agradá-lo. Nenhum de nossos gestos de desprendida amizade lhe valia alguma coisa diante da maldade repentina do doce que jogávamos fora. E quantas vezes na vida a gente não é vítima (ou vilão) nessa desigual contabilidade? Porque, exceto em certos casos de tendência inata a mal-interpretar gentilezas banais, se alguém nos decepciona é porque nos fez bem. E que estupidez a nossa de esperar atitudes sempre amáveis, mesmo sabendo que nenhum de nós, nem nós mesmos, somos capazes de sermos o tempo todo bons. É, precisamos repensar nossas desilusões.
12/02/2012
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ResponderExcluirBelo texto, bela reflexão. Uma ocasião me vem à mente. Parando para pensar, mais de uma. Acho que muitas ocasiões virão à mente de quem ler este texto. Bem a propósito para a saúde das amizades e dos afetos, e para colocar as coisas em perspectiva.
ResponderExcluirEu gosto muito do lir. E gosto muito de sus textos. Até agora eu leí só treis, mas penso lir todos.
ResponderExcluirNeste texto meu lembra ao uma frase que fala acerca de que uma pessoa "esquecio mil coisas boas por uma que foi errada"
E isso é o que aconcteceu com as pessoas e o que a gente deve lembrar, tem sempre presnte para fazer que nao sucedea mais