Agosto é o mês do meu aniversário. E, apesar das piadinhas rimadas com esse mês, teoricamente o do desgosto, sempre tive orgulho de ter nascido no fim do inverno, quando os ipês florescem e salpicam de amarelo a paisagem insossa do cerrado. Junto a isso o fato de ter desejado ser budista algum tempo atrás. E um dos preceitos que eu mais admirava nessa religião oriental era o da contemplação. Porque isso eu achava que fazia bem. Achava, porque, nas minhas andanças, passei alguns dias em Córdoba, na Argentina. E fiquei admirada com a habilidade dos “cordobeses” (?) de, com aquele jeito engraçado de falar que eles têm, simplesmente parar no tempo. Em torno do ritual do mate, os grupos se reúnem, as famílias, os casais, e ficam nas praças, nos parques, sentados na grama, compartilhando o mate ao cair da tarde, conversando, desfrutando do frio, que, àqueles dias, era bonito sem ser dolorido. É verdade que a adoração pelo mate não é exclusividade daquele lugar – no Uruguai, as pessoas são tão fanáticas, que tomam mate andando de bicicleta! –, mas foi ali que eu presenciei essa situação de rara calmaria. E eu fiquei contemplando: a tranquilidade, o dia, os parques, os cães e as crianças, assim, inspirando e expirando, como se pudesse parar o tempo e estar eternamente naquele banco de cimento, entre as árvores, em companhia das melhores carícias. Depois, na semana passada, senti algo parecido em Natal: quando a lancha parou em alto mar, e em volta havia o céu em seu azul mais absurdo, e os golfinhos que surgiam sem dizer nada, eu abandonei a câmera e desisti de tentar fotografar o instante. Fiquei em silêncio, sentindo o movimento das ondas, levemente sob a embarcação. Perguntaram se eu estava passando mal e eu disse: “não, estou só contemplando.” Ainda assim, admiro mais as pessoas de Córboda, que se dão tempo no espaço da própria cidade. Engano bobo pensar que a gente precisa gastar fortunas com viagens ao litoral para desfrutar das estações e dos dias que passam. Voltando para casa, no caminho desde o aeroporto, pela janela: os ipês de agosto salpicavam de amarelo a paisagem insossa do cerrado.
23 de agosto de 11.
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ResponderExcluirA Rafaella me lembrou de que seu aniversário é hoje! Parabéns Amâncio! Eu não venho comentando muito os textos por preguicinha mesmo, mas esse não pude deixar passar, ADOREI o texto! Nossa, que tanto de viagem! Tem alguma relação com o doutorado?
ResponderExcluirBeijos!
Também gosto da idéia de contemplação... é uma felicidade calma. Adorei o texto!! :)
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