“Pessoas foram feitas para serem deixadas, como apartamentos alugados e pequenas cidades do interior.” Assim começava um texto a que dei início há muito tempo e que nunca consegui terminar. Talvez porque, se não me falha a memória, se parecesse bastante com alguma coisa que eu lia na época, Caio Fernando Abreu ou algo assim. Volta-me, às vezes, como um estribilho, mas a que não consigo dar continuidade sem engastalhar em clichês e pieguices. Volta-me, agora, por associação: falaram-me, há poucos dias, sobre dois filmes que não revejo há muito tempo: “Antes do amanhecer” e “Antes do pôr-do-sol”, com aquele casal belíssimo, a Julie Delpy e o Ethan Hawke. Os dois se conhecem por acaso em um trem para a Áustria, vivem um romance intenso como um poema feminino, depois se despedem – para se encontrarem, uma década depois (no segundo filme), casualmente, em Paris. É, a princípio, uma história sobre a beleza das coisas passageiras, sobre “as coisas findas que (muito mais que lindas)” ficariam... Mas o roteirista não dá conta: ele insere essas confortáveis reticências, essa parte dois, esse “e eles decidem ficar juntos no final”. Porque nós, na maioria das vezes, também não damos conta: a gente fica esperando as cenas do próximo capítulo, o reencontro, o dia seguinte. E não entende que há coisas na vida que só podem durar um instante, que enferrujam no segundo amanhecer, que logo viram pôr-de-sol. Faço aniversário daqui a alguns dias e, enquanto alguém num lugar distante diz pensar em mim ao assistir a esses filmes românticos, peço que a idade ímpar que alcanço agora traga-me sobretudo a inteligente desesperança na parte dois de certas coisas.
(17/08/2010)
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que dia é o seu aniversário professora?
ResponderExcluirJá vá se preparando, com a idade o cabelo cai, a coluna entorta, as rugas aparecem, o Auzheimer começa e só vai piorando.
ResponderExcluirPalavras de incentivo para a professora. Viva nosso amor!!!
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