sábado, 18 de dezembro de 2010

Como no título do livro de Charles Dickens

O problema com a expectativa é que todo o mais vira um mero coadjuvante diante daquilo que se espera. A gente não pensa simplesmente “Faltam nove dias.” A gente pensa: “Eu ainda TEREI QUE VIVER nove dias até lá.” Sinto isso desde muito nova, porque, na minha casa, sempre levou-se muito a sério que os presentes só chegavam nas datas especiais – a saber: Páscoa, aniversário, dia das crianças, Natal. (Por sorte, meu aniversário, que é em agosto, equilibrava bem a sequência de dádivas anuais.) Mas era o Natal a data mais esperada, não apenas porque, com o décimo-terceiro salário, o presente tendia a ser bem melhor do que os outros, mas por toda a ritualística: como uma saga, vencíamos a parte chata da missa, esperávamos ansiosos a chegada do Papai Noel, assim como, dias antes, havíamos aguardado a vinda de nossos primos de São Paulo; e então havia toda aquela comilança, e adultos bebendo e rindo alto na casa dos meus avós, enquanto nós corríamos pelo quintal, entre as árvores, exibindo o que tínhamos ganhado horas antes, ainda com perfume de novo. Lembro, porém, do quanto me sentia triste no dia seguinte. Com nitidez, recordo-me de um ano em que me sentei na escada de casa, fiquei olhando para o nada, e pensando, justamente, que ainda teria que viver um ano inteiro até que o próximo Natal chegasse. E isso tinha um peso insuportável à época. Mais tarde, aprendi a saborear a espera mais do que a conquista... porque, como num conto da Clarice Lispector, ficava a pergunta: “E o que é que a gente faz depois que é feliz?” Hoje, não sei, talvez tenha aprendido a agir com equilíbrio diante da questão. O dia está bonito, independente da espera. E garanto que, este ano, não me sentirei triste quando o Natal passar.

*
Ainda falando do tempo (e de “great expectations”)... Demorei meses para compreender o álbum novo do Anathema, “We´re here because we´re here”, o primeiro trabalho de estúdio lançado desde 2003. Demorei, claro, porque esperei encontrar um Anathema que já não existe mais; em contrapartida, deparei-me com canções de uma tocante euforia, tão etéreas que chegam a lembrar os islandenses do Sigur Rós. É possível ver pelas capas dos discos o quanto a banda se modificou ao longo desses vinte anos de estrada: pense no soturno e quase tenebroso “The Crestfallen Ep” (1992), passando pela penumbra de um “The Silent Enigma” (1995), até a claridade panteísta desse novo CD, que, na capa, ilustra um indivíduo apoiado sobre o horizonte, amplamente iluminado entre o céu e o mar. Até a estilização da fonte no nome da banda se alterou, simplificando-se. O som ganhou leveza, melodias suaves, mais teclados e sequências de acordes maiores que sugerem uma abertura, um aparente otimismo por parte do grupo inglês que, após passar por uma fase de penúria, em que precisaram pedir contribuições aos fãs pelo site, consegue, finalmente, lançar outro CD. As letras falam de amor, energia, comunhão, eternidade e soam a autoajuda, em certos momentos (“Only you can heal your life”), o que se compensa com a poesia despretensiosa de outros versos (“Love stills my mind like the sunrise”). Destaques para “Thin Air” (faixa que abre o disco), “A Simple Mistake” e a belíssima "Dreaming Light".

(18/12/2010)

3 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. E o ruim de algumas esperas em particular é quando você vai criando expectativa e ao final, na hora H, não é o que você esperava...#raiva#

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