terça-feira, 10 de abril de 2012

Sobre o Morrissey e os urubus

Já faz mais de um mês que fui ao show do Morrissey aqui em BH e, não por acaso, ainda me perguntam o que foi que eu achei. Bem, foi emocionante. Todos os ingressos vendidos, a cidade como sob o efeito de alucinógenos (ao menos, o meu círculo de convívio), e dá-lhe comentário pós-show e curtições no Facebook (disseram-me). Eu, infelizmente, não consegui escrever a respeito (talvez mal consiga agora) e nem me reuni com os fãs no “Pastel da Savassi” para avaliar o que fora tocado de melhor e o que faltou no repertório. Ao final do concerto, tudo o que eu queria era vir para casa e ficar em silêncio, enquanto certos acordes ainda me cobrissem. Certos acordes e várias palavras. Porque foi especialmente pelas letras que me interessei pelos Smiths, quando, pouco mais que pré-adolescente, li sobre eles na coluna do Álvaro Pereira Jr, na Folha de São Paulo. “Música para quando o telefone não toca no sábado à noite”, era como ele descrevia “I know it´s over”, na qual o eu lírico começa gritando pela mãe, contando que o chão lhe cai sobre a cabeça, e vai seguindo até aquele trecho-tortura que pergunta “se você é tão inteligente, divertido, bonito... o que você está fazendo sozinho esta noite?”, terminando com o cúmulo do dolorido: “o amor é natural e real, mas não para mim, nem para você, meu amor.” E, sim, ele tocou essa canção. Houve quem chorasse. Mas houve quem deixasse as lágrimas para a agridoce “Please, please, please let me get what I want” ou quem cantasse alegremente o mórbido refrão de “There is a light that never goes out”: “E se um ônibus de dois andares/Colidisse contra nós/Morrer ao seu lado/Que jeito divino de morrer/E se um caminhão de dez toneladas/Matasse a nós dois/Morrer ao seu lado/Bem, o prazer e o privilégio seriam meus.” A verdade é que o Morrissey poderia muito bem ter me ensinado a ser vegetariana, assexuada ou algo britânica, mas o que obtive dele foram apenas incontáveis lições de amor – o que seria uma desgraça se não fosse tão poético.

*

Muito tempo atrás, escrevi um conto chamado “Os urubus são pássaros que voam alto”. O texto é péssimo, mal costurado, inconstante, mas gosto do título ainda e sigo fascinada pelo voo desses animais tão bizarros – sem alusões futebolísticas neste momento.
Dias atrás, tive a oportunidade de maravilhar-me de perto com o conhecimento do céu e dos ventos de que dispõem essas aves, e com o fato de que certos homens, muito espertinhos, baseiam-se nelas para procurar os melhores momentos para saltar e os mais promissores pedaços do céu para, a seu modo – num paraglider –, voar. Quase fui junto e lamento muito o tamanho desse quase. Certas aventuras talvez precisem ser adiadas para que se amplie a altura do encanto.

(10 de abril de 2012)

Nenhum comentário:

Postar um comentário