segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Enquanto leio André Comte-Sponville...

Perto da minha casa, em TC, vivia um carpinteiro apelidado Queijo. Ele era careca, barrigudo e tinha a barba longa como a de um velho marinheiro. Foi responsável pelos nossos armários embutidos, cuja qualidade é atestada há décadas, e por diversos outros utensílios domésticos, como o “chiqueirinho” do meu irmão. Nós, às vezes, o visitávamos em família, e me lembro bem de encontrar, em sua casa, os objetos de madeira em estado de preparação, sólidos, crus, pesados, sem ânimo. Mas eis que então eles apareciam, depois, com brilho e beleza, que me disseram ser fruto de uma camada de verniz. Verniz. Eu, que, àquela época, sabia ainda menos do que hoje sei sobre a vida, encantei-me com aquela palavra e seus efeitos sobre as coisas. Verniz: por quantas vezes será que nós, em busca de nos convencermos de uma felicidade além, não cobrimos nossas vontades, nossas conquistas, certas pessoas e lugares e bens materiais com uma camada caprichada de verniz? Será que, se não exagerarmos, para nós mesmos e para os outros, o valor de certas coisas, a vida será tão seca que não suportaremos a melancolia do opaco? Quantas vezes já não nos convencemos de que X ou Y eram nossa meta maior, sem saber que, por trás do verniz, não passavam de um sólido de madeira ordinária, sem valor e luz própria? (10 de setembro de 2012.)

Um comentário:

  1. Minha amiga querida,

    Amei ler seus posts aqui no blog. Virarei leitora assídua! Esse post é maravilhoso e gostaria de pedir sua autorização para postá-lo no meu facebook, posso? Divulgarei a autoria, obviamente, mas é que, como já lhe disse algumas vezes, você diz coisas que parecem ser uma leitura de mim mesma.

    Beijos dessa amiga que muito te admira.
    Ceres

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