domingo, 8 de maio de 2011

Gradiva

“Gradiva” é um nome que, recentemente, em razão de um filme, voltou a fazer parte da minha vida, mas que me apareceu, pela primeira vez, após um elogio inusitado. Cerca de cinco anos atrás, um professor de Teoria da Literatura me disse: “Sei que isso vai parecer estranho, e me perdoe se soar desrespeitoso, mas... estive observando os seus pés. E preciso dizer: você tem simplesmente os pés mais bonitos que eu já vi. Você deveria ser dublê de pé, modelo de propaganda de sandália!” Falou-me, então, de um livro, um romance de Jensen, do início do século passado, sobre o qual – depois vim a saber – também Freud escreveu, e que se tratava justamente de um homem que se apaixona por uma mulher por causa da beleza de seus pés. E acrescentou: "Uma mulher com os seus pés precisa ler Jensen!" Pois bem: na semana passada, fui eu a uma loja de sapatos. Pedi um calçado que fosse, ao mesmo tempo, bonito e confortável – o que parece ser uma combinação paradoxal. O vendedor me olhou incrédulo e passou em revista toda a loja, desesperançoso. Depois de algum tempo, porém, arriscou: “Há calçados que são feios fora do pé, mas, se você calçar, quem sabe...” Pus-me, então, a experimentar as sandálias, sapatos, sapatilhas que ele me apresentava. E, acredite: todos eles, de alguma forma, pareciam transformar-se. Uma senhora sentou-se ao meu lado e passou a observar meu exercício de experimentação. Qualquer par que eu colocasse no pé, e ela dizia: “Que bonito!”, perguntando, em seguida, inquisitiva: “Você vai levar? É que eu gostei tanto...” Eu tirava o calçado do pé e lhe entregava – em respeito aos mais velhos. Ela experimentava e os devolvia ao vendedor, correndo novamente para, com todo o respeito, “urubuzar” o calçado que eu estivesse testando no momento. Houve um instante em que ela chegou ao cúmulo de se interessar por um par que o vendedor acabara de tirar das mãos, ou dos pés, dela: “Que lindo! Onde você achou? Será que tem o meu número?” Eu começava a ficar irritada: “Mas a senhora acabou de experimentá-los! E não quis!” Acabei me afastando da pobre senhora e indo sentar-me junto a duas outras mulheres, que, adivinhe, queriam saber onde eu tinha encontrado aquele par ali, que estava justamente nos meus pés... Enfim. Saí da loja feliz e saltitante, com quatro pares novos de calçados – o que faz a alegria de qualquer mulher – e desconfiada de que o elogio do meu professor tinha lá o seu fundo de verdade.

(08/05/2011)

Um comentário:

  1. Hahahahahahahaha...

    E eu, que sempre achei meus pés perfeitos, quando fui fazer avaliação física numa academia, o fisioterapeuta se contorceu de rir e ainda chamou o professor da academia para ver o que ele dizia ser "o par de pés mais feio que ele já tinha visto na vida"! Mas essa foi minha única - e traumática - avaliação negativa sobre eles.

    Ainda estou convencido de que são perfeitos. :D

    ResponderExcluir