quarta-feira, 11 de julho de 2012

O campeão dos campeões

No dia em que convenci, sob ligeira pressão, o meu primo Juninho a tornar-se corintiano, confesso que senti uma ponta de culpa. Pensei no menino padecendo, como eu, a eterna falta de Libertadores, nas piadinhas, na sequência de quases. Lembrei a derrota de 3 X 0 para o Grêmio, no Olímpico, em 1996, e a manhã seguinte, quando eu, de olhos inchados de tanto chorar, faltei a aula pela primeira vez “sem justa causa”. Pensei em 1999, quando o Corinthians, na final do Paulista, derrubava o Palmeiras, que, dias antes, havia sido campeão da Libertadores e eliminado o Timão nos pênaltis. De como o Paulo Nunes surgira do vestiário alviverde, com a faixa das Américas sobre o peito, como um diabo loiro vindo dos infernos, saltitante, dizendo: “Fiquem com o Paulistinha de vocês; nós temos a Libertadores.” Ah, como eu quis, por anos, cuspir na cara dele por aquela declaração leviana, desleal, verdadeira. Não sabia ainda da futura eliminação para o Flamengo, o time que tinha um matador no gol e que não deixou que bola alguma entrasse, justo no ano do centenário. E não pressentia sequer que deixaríamos a competição antes do seu início, em 2011, toliminados por um time colombiano. Por isso, quando, na última quarta-feira, com o segundo gol do Emerson, nosso sheik, pude cair de joelhos no chão e gritar “acabou!!!”, meu pensamento seguinte foi nele, no Juninho. Ele é muito novo e ainda não tem consciência do que, de fato, representa esse título; mas eu sabia que, com ele, muito peso nos saía das costas, e que, mais do que alegria, nós sentíamos era alívio. Pois apavorava andar pela rua naqueles dias, porque a secação era emanada de todos os lados, de dentro de nossos amigos mais próximos, até de nossos mais bem quistos familiares. Era, de fato, o Corinthians contra o resto do mundo. Eu me mantive incrédula e mesmo pessimista a maior parte do tempo, porque sempre receei o esquema retranqueiro do Tite, reclamei a ausência de um atacante criativo, sempre soube que os adversários que enfrentamos eram, em muitos aspectos, superiores à nossa equipe. Mas havia uma força estranha, desde o começo desta competição, que travou o Diego Souza, apagou o Neymar, amoleceu o Riquelme, calçou as chuteiras no Romarinho e que, sobretudo, guiou para a trave o chute do Cvitanich na Bombonera, aquele estádio-bomba atômica, ensurdecedor. Naquele instante, aos 46 do segundo tempo, meu irmão, são paulino declaradamente anti-corintiano, suspirou um “é...”, levantou-se do sofá lentamente e começou a preparar-se para dormir. Foi quando eu tive um lampejo de esperança. Foi quando eu acreditei. Aquele gesto era um reconhecimento, para ele melancólico, de que, este ano, nada tirava o título do Corinthians. Por tudo isso é que eu me emociono em saber que, em São Paulo, no histórico dia 04 de julho de 2012, aconteceram sucessivos foguetórios, em horários combinados, barulhentos, incômodos, a começar pelas 6h da manhã, quando um bando de loucos gritava “Vai, Curíntia!”, numa energia que era ao mesmo tempo oração e cólera. Por isso acompanhei a pequena multidão uniformizada, que parava carros, entoando o hino alvinegro, na madrugada de quinta-feira, em BH. Porque demorou tanto, doeu tanto, foi tanta humilhação, tanto medo, que, agora que é de verdade, tanto faz todo o resto. Amo o Corinthians. Somos campeões invictos da Libertadores. E, agora, o mundo pode acabar. (11 de julho de 2012)

Um comentário:

  1. Notável como o esporte é capaz de gerar tamanha paixão, tão intensas alegrias, sofrimentos e catarses. Uma simples bola, uns reles pedaços retangulares de pau, um bocado de seres humanos, um conjunto de regras e camisas. Principalmente camisas. E bandeiras, e cantos, e gritos de guerra. É engraçado, porque até meu pai, que nunca gostou de futebol (para dizer o mínimo), anda enxergando interesse no esporte, com frases como "o futebol exige inteligência" ou "os jogadores precisam de raciocínio rápido". Uma abordagem intelectual distante do desnorteamento frenético das emoções de um torcedor, mas que ilustram, à sua maneira, o fascínio desse jogo.

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